quarta-feira, 4 de abril de 2018

A cultura e a cultura centralista

É sempre difícil, sob o ponto de vista político, discutir o financiamento público (ou apoio, talvez prefira este termo) à cultura. Não apenas porque os recursos são (e serão sempre) escassos. Não apenas porque a própria expressão cultural tem uma incontornável dimensão subjectiva. Não apenas porque há uma certa cultura de casta, de direito «natural», de exigência extremada. A dificuldade da discussão explicar-se-á por todas estas razões e outras mais. Talvez acrescente ainda algum preconceito, mais expressivo numa certa direita (que não a minha), que entende que a cultura, como qualquer outra indústria, se deve cumprir à luz das regras do mercado.

Eu gostaria que a discussão se pudesse fazer num clima de civilidade democrática, sem chavões e com racionalidade. Mas não creio que haja essa disponibilidade.
De todo o modo, sempre valerá a pena deixar dito (é o mínimo) que há determinadas expressões culturais, ou porque não são economicamente sustentáveis ou porque não existem, que devem ser apoiadas e fomentadas pelo Estado.

Não reconhecer a importância das diferentes formas de expressão cultural (a dança, a música, o teatro, etc), a indispensabilidade de uma rede de teatros nacionais e municipais, de Museus Nacionais e Municipais, de uma Casa da Música ou de uma Fundação de Serralves (para recorrer a exemplos que conheço bem), seria quase como negar que o mundo é redondo. E não reconhecer que é importante «deselitizar» o acesso à cultura é – isso mesmo – elitista (tristemente elitista).
Não tem a ver com o querer ser (ou parecer) cosmopolita. Se quiserem uma fundamentação política (que tem vingado no Porto) tem a ver com a ideia de que a cultura é também um importantíssimo instrumento de coesão social. E nem sequer entro com argumentos de identidade, de formação, de exigência.
Eu, por mim, passava à frente da discussão sobre a bondade da promoção e do financiamento público à cultura. Ela é óbvia.

A polémica destes dias à volta dos subsídios ou apoios plurianuais suscita-me um outro tema. Um tema gasto, cansativo e permanente. Não devia ser assim, mas é sempre assim.
O Lisboacentrismo é doentio, mina a confiança do país no Estado, e põe permanente e criminosamente em causa a coesão territorial. Não falo do Porto (para que não pensem o também cansativo «lá vêm os tipos do Porto com o queixume»). Falo do país. Do Algarve ao Minho, do litoral ao interior. A distribuição dos apoios anunciados não é distribuição nenhuma. Onde devia estar distribuição está concentração. E no sítio do costume. Independentemente dos critérios de atribuição em concreto (àquele ou a outro projecto, àquela ou a outra companhia de teatro, àquele ou a outro festival) o critério territorial é inaceitável.

Se há fenómeno que urge não apoiar (mesmo!) é este que nos sufoca e que dá pelo nome de cultura centralista.

#Escritório
#Biblioteca

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