terça-feira, 27 de novembro de 2018

A coragem e o herói (e a logística)

Com excepção do primeiro, o nascimento de um filho traz consigo um bruaá (escreve-se mesmo assim) social que anda muito à volta da ideia de coragem e de heroísmo. Que coragem, nos tempos que correm!, repetem-me. És um herói!, também me dizem. E, mais recentemente, interessam-se muito com a logística. Sim, com a logística. E como é de manhã para sair de casa? Imagino a logística das refeições e das roupas! (logística é mesmo um termo repetido).

Não sei bem como responder. Sinceramente não sei. Porque não é a logística que me ocupa (quer dizer, chateia-me quando obriga a mudança de carro, pelas poucas alternativas e a preços escandalosos). Nem me ocorre essa ideia de coragem (nem sei de que coragem falam). Muito menos o heroísmo (herói em quê exactamente?).

Eu por acaso o que sinto (e acho que nunca consegui explicar) é que é tudo muito simples. Simples no sentido de descomplicado e pouco elaborado. E a simplicidade, por paradoxal que pareça, gera confiança.

É certo que há muita coragem, que não a minha. E que ainda há heróis, que não eu. Porque se posso dar algum testemunho (dizer “testemunho” é presunçoso...) é que, sem mérito nem arte, talvez se explique (se me perguntam por uma explicação) por aquela simplicidade e confiança. Talvez seja isso.

#Saladeestar

terça-feira, 20 de novembro de 2018

Deputados adultos

Aí pelos meus 13 anos passeava-me com um molho de folhas (uns formulários todos iguais) na mochila. Tenho ideia de ter recorrido a esses formulários pouquíssimas vezes. Já então era crítico da necessidade dos «formulários» (ainda que os percebesse) e apostava na sua extinção na idade adulta (sublinho, adulta).
Quando, por estes dias, um coro de «virgens ofendidas» ocupou o espaço mediático indignando-se com a falsa presença do deputado José Silvano do PSD numa reunião plenária da Assembleia da República (acompanhava à mesma hora o líder do seu partido numa reunião política em Santarém) lembrei-me do molho de folhas na minha mochila de adolescente (já lá irei). Claro que todo o episódio é pouco edificante – a ideia de um deputado produzir falsas declarações (pessoalmente ou em conluio) é suficientemente degradante e ilustrativo. E o solidário silêncio da esmagadora maioria dos seus pares (de uma ponta à outra do hemiciclo) é a demonstração cabal de como, afinal, os pactos de regime são possíveis.
O meu ponto não é, contudo, a falsa presença, a explicação atabalhoada, a desvalorização nervosa, a contradição eloquente, o silêncio de regime, e o despudor da conclusão final. Francamente nem eu nem ninguém fomos assaltados por um sentimento de surpresa. E, já sem remorso, confesso-me anestesiado. Quem pouco espera pouco se surpreende.
Convém, no entanto dizer (e é estranho que ninguém com voz o diga) que o desdém que cada vez mais destinamos a quem nos representa alimenta-se muito das nossas contradições e da exigência infantilizada que reservamos ao exercício da política e à dignidade da representação política.
Quando olho ao regulamento a que os nossos deputados se subjugam não consigo evitar a memória do “molho de folhas” na minha mochila de adolescente.
Que sentido faz - penso tantas vezes - aquele hemiciclo com 200 ou mais deputados, em debates sectoriais, em que não mais de meia dúzia (se tantos) participam? E porque se há-de medir o exercício da representação pela mera presença em plenário? E mesmo o trabalho das comissões (os deputados refugiam-se muito na invocação do trabalho nas comissões) é assumido por três ou quatro com os demais quinze ou vinte a folhear papéis ou a passar o dedo pelo telemóvel. E se é assim - e “gostamos” tanto de o bradar indignados - que sentido faz fingirmo-nos exigentes com a presença de todos os deputados naquelas sessões?

Eu não me revejo em nada disto, devo dizer.
Eu tenho muito mais respeito pelo exercício da representação popular no parlamento. Eu exijo muito mais do que a rotineira e infantil presença no hemiciclo, na comissão ou no que for. E assusta-me a presunção de incumprimento que a instalação de um sistema de controlo de presenças pressupõe.

Não meço a minha posição nesta matéria. Um deputado não devia estar sujeito a qualquer controlo de presenças. A ausência de um deputado deveria gozar da presunção de que está em trabalho político como é próprio de um parlamentar que representa cidadãos. Os deputados tanto deveriam estar no parlamento como deveriam estar no seu círculo eleitoral. Sem qualquer sistema de controlo. Como adultos que são, eleitos democraticamente, e com a dignidade que essa legitimidade eleitoral lhes confere.
E mais. Este modelo livre de exercício do mandato (em coordenação com cada grupo parlamentar, naturalmente) era muito mais justo, servia melhor a urgente aproximação entre eleitos e eleitores, promovia até a coesão territorial (pela presença disseminada e mais constante dos representantes nacionais nos círculos regionais). E trazia ainda um suplemento de justiça àqueles cidadãos que se predispõem a partir de armas e bagagens para um mandato de quatro anos em Lisboa, não sendo necessário (nem recomendável) permanecer em Lisboa toda a semana e todas as semanas (os mais de 50 deputados de Lisboa não terão a noção de como é diferente e exigente um cidadão com a sua vida profissional sedimentada predispor-se à tal mudança de “armas e bagagens”). Às tantas teríamos outros deputados. E suspeito que melhores.
E o que tem o molho de folhas na minha mochila aos 13 anos a ver com isto? Nada. Ou tudo. Aquelas folhas eram formulários de justificação de faltas pré-assinados pela minha mãe que mos confiava (a mim e ao meu critério e responsabilidade) para quando precisasse (ou quisesse) faltar às aulas.
Tratamos os nossos deputados (e estes deixam-se tratar) como crianças a quem é preciso controlar as faltas e faltinhas que nem a minha mãe quando eu tinha 13 anos...
Eu gostava de ter deputados (tratados como) adultos.

#Escritório

quinta-feira, 15 de novembro de 2018

Brexit dos garotos


O que impressiona mais neste caos político que se vive no Reino Unido é que ele foi inventado (inventado, literalmente) por ímpetos de mero cálculo e jogo político.
A crise, verdadeiramente, não existia. Ela deve-se exclusivamente a duas personalidades (mais à primeira) que ocuparam ou ocupam o tal número 10 de Downing Street.
A cartada do referendo, jogada por Cameron, e a cartada seguinte das eleições antecipadas, jogada por May, são os exemplos mais chocantes (no sentido gráfico do termo) de como dois Primeiros-Ministros jogam um país na dúvida e na ansiedade.
Há muito de presunção britânica em cada um destes protagonistas. E essa presunção, sempre cheia de pose, é no fundo uma garotada.
Se fosse um jogo, era lá com eles. Mas é um país. Nas mãos de garotos.

#Escritório

quinta-feira, 8 de novembro de 2018

O Polígrafo


É engraçado que o anúncio do “Polígrafo” - o novo projecto jornalístico (creio que se pode dizer jornalístico) que se dedicará a sindicar as informações e as declarações dos políticos, para, no fundo, pôr a nu as fake news e as declarações pouco rigorosas que circulam por aí (especialmente nas diabólicas redes sociais) - gerou a mesma reacção entre esquerda e direita, conservadores e liberais, moderados e reaccionários, interessados e distantes. Todos confiantes que, a singrar o dito Polígrafo, e cumprindo este competentemente a missão a que se propõe, finalmente será desmascarado, sem apelo nem agravo, o “outro lado” e os seus protagonistas.
Por mim só digo que se correr bem, vai ser bonito.

#Saladeestar

O meu pitch


Se eu tivesse um «pitch» na Web Summit diria qualquer coisa como «as soon as possible» marque-se o «closing» do contrato de «build, own and operate» da «Kids Zone» no âmbito do «cluster» da saúde do São João.
Às tantas («to many»), como bom parolo, o Costa convencia-se que era coisa do Web Summit. E talvez tivéssemos, de uma vez por todas, a ala pediátrica do São João (perdão, a «Kids Zone» do «cluster» da saúde do São João, não vá o homem perceber …)

#Saladeestar