terça-feira, 22 de agosto de 2017

A liberdade ainda é de todos

Eu por acaso não acho nada indiferente que um político se assuma na sua orientação sexual. A entrevista da Graça Fonseca ao DN tem interesse por várias razões (deixarei para o fim a parte da revelação sensação).

Desde logo é uma entrevista que nos dá a conhecer uma política (no sentido de sujeito) que pensa e fundamenta a sua própria presença na política, que tem sentido crítico, que revela elegância no modo como vê «o outro lado» e, especialmente, como se vai desviando das perguntas algo tendenciosas e desnecessariamente opinativas que lhe foram sendo colocadas. Fê-lo sempre com serenidade e fundamentação e em contra corrente com o tom populista e preconceituoso da entrevistadora – que subliminarmente lhe pedia a adesão que ela não dava (é interessante o modo como responde, sempre com contemporização, à generalização sobre o PSD, sobre o Partido Republicano, sobre o fenómeno racial, ou até como procura explicar o que sabemos das tendências do sistema de justiça no julgamento de estrangeiros).
Eu gostei da entrevista. Gostei de conhecer um pouco mais da Graça Fonseca.

Ora, com isto eu não estou a dizer que concordei com o que a Graça Fonseca foi dizendo, com as opiniões que foi expondo e a mundividência política que representou. Se bem interpretei a política Graça Fonseca, eu vislumbrei naquela entrevista alguém com quem eu me posso entender numa sociedade plural como a que defendo. E foi por isso que eu gostei da entrevista. Porque eu temo – temo mesmo – pela ausência de interlocutores disponíveis, de boa-fé, com fundamentação, nas diferentes facções do nosso espectro político.

Já quanto à revelação da sua homossexualidade eu repito. Não acho nada indiferente que um político livremente (e este livremente é intransponível) se assuma na sua orientação sexual. Para quem, como eu, acha que a avaliação de uma proposta de transformação política implica conhecer os seus protagonistas – o que passa por conhecer o seu carácter, os seus gostos, a sua mundividência – não é indiferente conhecer a sua história, nela podendo relevar a orientação sexual. E como há, por razões de maioria, uma presunção de heterossexualidade (não percam tempo a qualificar a presunção), essa revelação é mais pertinente no caso dos homossexuais. Não confundam – podem confundir, mas estarão a deturpar – com querer saber o que cada um faz ou não faz em casa (faço ouvidos moucos à curiosidade de sarjeta). Não confundam – podem confundir, mas estarão a deturpar – com obrigar ou esperar de uns o que não se obriga ou espera de outros. Não confundam – podem confundir, mas estarão a deturpar – com «proscrição» de uma orientação sexual face a outra.

Uma sociedade livre é mesmo isto. É também a assunção livre da orientação sexual. E é a liberdade de quem acha muito bem (a revelação e a opção) a saudar, quem não concorda a condenar, e quem acha indiferente a desprezar ou não ligar. Todos com a mesma liberdade pessoal. O que quer dizer – e este ponto é muito importante – que quem acha bem não deve «obrigar» aqueles que não concordam a concordar (com a revelação ou simplesmente com a opção ou com a sua promoção). Porque a liberdade ainda é de todos.

#Escritório

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