É sempre difícil, sob o ponto de vista político,
discutir o financiamento público (ou apoio, talvez prefira este termo) à cultura. Não apenas
porque os recursos são (e serão sempre) escassos. Não apenas porque a própria expressão
cultural tem uma incontornável dimensão subjectiva. Não apenas porque há uma
certa cultura de casta, de direito «natural», de exigência extremada. A
dificuldade da discussão explicar-se-á por todas estas razões e outras mais.
Talvez acrescente ainda algum preconceito, mais expressivo numa certa direita (que
não a minha), que entende que a cultura, como qualquer outra indústria, se deve
cumprir à luz das regras do mercado.
Eu gostaria que a discussão se pudesse fazer
num clima de civilidade democrática, sem chavões e com racionalidade. Mas não
creio que haja essa disponibilidade.
De todo o modo, sempre valerá a pena deixar
dito (é o mínimo) que há determinadas expressões culturais, ou porque não são economicamente
sustentáveis ou porque não existem, que devem ser apoiadas e fomentadas pelo
Estado.
Não reconhecer a importância das diferentes formas
de expressão cultural (a dança, a música, o teatro, etc), a indispensabilidade
de uma rede de teatros nacionais e municipais, de Museus Nacionais e
Municipais, de uma Casa da Música ou de uma Fundação de Serralves (para
recorrer a exemplos que conheço bem), seria quase como negar que o mundo é
redondo. E não reconhecer que é importante «deselitizar» o acesso à cultura é –
isso mesmo – elitista (tristemente elitista).
Não tem a ver com o querer ser (ou parecer)
cosmopolita. Se quiserem uma fundamentação política (que tem vingado no Porto) tem
a ver com a ideia de que a cultura é também um importantíssimo instrumento de
coesão social. E nem sequer entro com argumentos de identidade, de formação, de
exigência.
Eu, por mim, passava à frente da discussão
sobre a bondade da promoção e do financiamento público à cultura. Ela é óbvia.
A polémica destes dias à volta dos subsídios ou
apoios plurianuais suscita-me um outro tema. Um tema gasto, cansativo e permanente.
Não devia ser assim, mas é sempre assim.
O Lisboacentrismo é doentio, mina a confiança
do país no Estado, e põe permanente e criminosamente em causa a coesão
territorial. Não falo do Porto (para que não pensem o também cansativo «lá vêm
os tipos do Porto com o queixume»). Falo do país. Do Algarve ao Minho, do
litoral ao interior. A distribuição dos apoios anunciados não é distribuição
nenhuma. Onde devia estar distribuição está concentração. E no sítio do costume.
Independentemente dos critérios de atribuição em concreto (àquele ou a outro
projecto, àquela ou a outra companhia de teatro, àquele ou a outro festival) o
critério territorial é inaceitável.
Se há fenómeno que urge não
apoiar (mesmo!) é este que nos sufoca e que dá pelo nome de cultura centralista.
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