terça-feira, 14 de agosto de 2018

Prego per tutti!


Em Março de 2001, quando caiu a ponte de Entre-os-Rios, estava eu de armas e bagagens em Milão há mais de 6 meses. Já estava na fase em que falava relativamente bem italiano, em que me sentia em casa e em que vivia quase como um italiano. Experimentei – ainda que não completamente – como é fácil a transição emocional de uma comunidade para outra. Se no início lia as notícias de Portugal, seguia os jogos do nosso campeonato e acompanhava as discussões que por cá se alimentavam (não era fácil porque só dispúnhamos de internet na faculdade e os sites eram ainda muito limitados), lenta e progressivamente fui começando a ler os jornais italianos, a seguir (e a ir a San Siro, onde ora jogava o Inter ora o Milan) o campeonato italiano e a interessar-me pelos fenómenos e temas que se viviam em Itália (na música, na política, na sociedade em geral). Lembro-me de pensar como Portugal era distante dos interesses e da «mesa» dos italianos. Para além do futebol, dos calciatores portugueses, que brilhavam sobretudo em Florença, e do Figo (era o tempo áureo do Figo), Portugal não existia em Itália.
O sobressalto com a nação foi-me provocado pela queda da ponte de Entre-os-Rios. Ao fim de seis meses, os telejornais abriram todos com uma notícia de Portogallo. Chocou-me profundamente aquele «regresso a casa» pela boca dos locutores italianos e pelas imagens que repetidamente passavam nos noticiários de um tabuleiro tombado sobre o meu rio Douro. Senti como minha aquela tragédia. Percebi que quando estamos fora se sentem mais os grandes momentos da pátria (acho que o termo certo é pátria). Cheguei a sentir vergonha e embaraço, como é próprio de quando somos nós próprios a falhar à frente de todos. É quase um sentimento de culpa objectiva.
Hoje sinto o mesmo. Mas ao contrário. Itália é seguramente a minha segunda pátria. Onde, insaciável, regresso e regressarei sempre que puder. As notícias da queda da ponte Morandi, em Génova, tocam-me no nervo sensível. Foi em Génova que corri para (voltar) a ver o mar (o mar que Milão não tem e que me faz sempre falta aos sentidos). Foi em Génova que tive uns laivos de Porto (não esqueci como a passeggiata do Corso Italia me sugeriu a minha Foz). E lembro-me de passar na agora fatídica ponte Morandi.
Não consigo ficar indiferente. Quase regresso àquele sentimento de culpa objectiva que me sobressaltou em Março de 2001. Regresso mesmo, aliás.
Prego per te e per tutti!

#Jardim

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