terça-feira, 28 de agosto de 2018

Ainda o comboio do PS


Não, o problema não é a CP ter garantido adaptar os demais comboios (ao que parece qualquer entidade teria esse tratamento em semelhantes circunstâncias). Aliás, a ideia de alugar um comboio até seria boa (afinal, o PS preocupa-se em privilegiar o transporte ferroviário nas suas próprias iniciativas, em detrimento do automóvel ou do autocarro).
Em face das circunstâncias, o problema é mesmo político.
A CP enfrenta problemas gravíssimos de falta de meios, de episódios recorrentes de atrasos e cancelamentos, de falta de qualidade no serviço, de avarias. E esses problemas estão na ordem do dia especialmente porque é flagrante o desinvestimento e os cortes na ferrovia nos últimos 3 anos de governo PS.
Independentemente do modo como cada um valoriza as prioridades do governo e, portanto, mesmo que não se ache criticável a opção pelo desinvestimento na ferrovia em face de outras urgências (não é o meu caso!), um facto era certo – politicamente, neste Verão de 2018, seria um tiro no pé optar pelo comboio numa iniciativa do partido do governo (para mais, beneficiando de regras de favor facilmente manipuláveis pela oposição e pela comunicação social). Qualquer assessor estagiário saberia ler politicamente o momento e alertaria para a necessidade de por estes dias se fomentar a «distância» relativamente aos comboios.
Mas não. Ninguém quis saber do momento político, das falhas de serviço que têm afectado as vidas das pessoas, dos números chocantes do investimento na ferrovia.
Dava jeito para a organização da iniciativa do partido e, portanto, toca de alugar um comboio como se nada se estivesse a passar.
Dirão que a oposição tem é que agradecer e aproveitar para endurecer o combate político. Talvez, mas a mim preocupa-me o significado da «inabilidade política» (consintamos na expressão).
A presunção e o despudor são inacreditáveis. E, sinceramente, assustam-me. Porque são uma manifestação de poder desmedido, de barriga cheia, quase de gozo e desprezo. Pior que o desinvestimento na ferrovia é o desinvestimento na ferrovia como se nada fosse, como se os problemas que esse desinvestimento está a provocar não existissem e não afectassem a vida das pessoas.
Desta vez foram os comboios mas poderíamos dizer o mesmo sobre os hospitais. A cada declaração comicieira sobre os serviços públicos e o Estado Social – em que o confronto com a realidade do investimento fazem esboroar a dúvida sobre a real convicção dos protagonistas – adensa-se a sensação de falta de vergonha.
Tenho imenso medo da falta de vergonha.
Pode parecer estranho mas o cálculo político, o pudor e o bom senso (é de bom senso que falamos também) protegem-nos dos políticos com muito poder. Quando falta tudo isso a quem tem poder ficamos mais expostos.

#Escritório
#Saladeestar

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