Há sempre dois grupos. Os que se dedicam a
indignar-se com a forma. E os que se dedicam a indignar-se com o conteúdo.
Há uns anos tivemos as escutas. E lá tivemos o
grupo que se dedicou a discutir a ilegalidade da forma («é ilegal!», zurziam, «não
valem como prova», esbracejavam). E depois tivemos o grupo da substância, que insistia
na indignação quanto ao que se testemunhava naquelas conversas gravadas («se
fosse o meu clube, eu tinha vergonha!», «ganhar assim, não quero!», ouvíamos à
boca cheia).
Hoje temos os e-mails (até ver, porque há ameaças
de mais revelações). Pois lá temos o grupo que só fala de quão grave é a
violação do correio privado («é gravíssimo num Estado de direito!», «é preciso
apurar como é possível a violação de correspondência privada!», dizem pelos
canais costumeiros). E, naturalmente, forma-se o outro grupo, o da substância,
que se indigna com o que as conversas revelam («está lá tudo!», «é uma rede
instalada de corrupção»!).
O curioso é que entre ontem e hoje são (quase
todos) os mesmos. Se olharmos aos da forma e aos da substância, estão lá os
mesmos. A diferença – pequena diferença – é que trocaram de lado.
Eu declaro-me já, para que não sobejem dúvidas.
Das escutas aos e-mails, acho indigna a violação «formal» num Estado de direito,
e envergonha-me a substância (que no que revela, é rigorosamente a mesma!).
Para muito boa gente, não é fácil reconhecer
isto.
#Saladejogos
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