Os fenómenos naturais têm o condão de nos
convocar para a nossa frágil condição. Mas essa constatação – que, no meio da
tragédia e do drama, tem o seu lado saudável – não deve servir (não pode!) para
incensar responsabilidades. Ninguém pretenderá imputar os ventos descontrolados,
as temperaturas de 40 graus e a trovoada seca (há sempre uma expressão técnica que,
a cada catástrofe, entra para o léxico popular). Mas no terreno dos
comportamentos, da educação, do planeamento, há seguramente muito por apurar.
E, portanto, responsabilidades por atribuir.
Não há fenómeno natural que pacifique uma sã
consciência cívica quando, em meia dúzia de horas, morrem mais de 60 pessoas. Não
há chuva, não há vento, não há terramoto, que afaste enormes dúvidas sobre a nossa
competência colectiva.
Exemplos de catástrofes «naturais» não faltarão
por esse mundo fora. Exemplos de uma mortandade a esta escala, num tão curto
espaço temporal, em condições «óptimas» como as que se anteviam, não se
encontram.
Podemos falar da protecção civil, nos
bombeiros, nas forças de segurança. Questionamo-nos como foi possível não se terem
fechado à circulação aquelas estradas imediatamente. Suscitamos o debate sobre
o modelo de exploração florestar e as espécies de árvores em que apostamos. Podemos
discutir a opção de investimento desproporcionada em favor dos meios de combate
e não das medidas de prevenção. Mas há ainda um outro debate que podemos e
devemos fazer e que se coloca no terreno da educação. Lembro-me muitas vezes
daquela criança americana que salvou a sua família no tsunami na ásia porque,
ao olhar ao comportamento estranho da maré, se lembrou das aulas de ciências e
avisou os pais de que estava a chegar um tsunami. Algum de nós aprendeu na
escola a comportar-se num ambiente de catástrofe natural? Algum de nós sabe o
que fazer se estiver no meio de um fogo? Alguém aprendeu regras básicas de
controlo pessoal?
Não. Não!
Desculpem-me mas esta tragédia humana
inimaginável não pode estacionar na nossa indignação estéril. E muito menos
pode justificar-se nessa expressão sonsa de «causa natural». Muita coisa tem de
mudar. Desde a escolha dos nossos protagonistas políticos, à política de
prevenção e exploração florestal, passando naturalmente pela estratégia de
protecção civil e de combate aos incêndios. E começando pelas escolas, onde valeria
a pena investir no ensino básico. De regras de sobrevivência, por exemplo!
#Escritório
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